UM BERÇO DE PEDRA




Mito: Medeia
Texto: Newton Moreno
Temporada: 30.09 a 06.11.16 (CCSP) | 13.04 a 07.05.17 (TUSP)
Local: Teatro da Universidade de São Paulo (TUSP) | São Paulo (SP)
Direção e Cenografia: William Pereira
Elenco: Cristina Cavalcanti, Debora Duboc, Jairo Mattos, Lilian Blanc, Luciana Lyra e participação especial de Sônia Guedes
Assistido em: 20.04.17
Duração: 90 min

Em forma de poema-cênico, a montagem intercala épocas, mitologias, espaços. As cinco cenas são gritos de mães perfuradas no ventre, comprimindo-as a perder e/ou defender suas crias, a restaurar e/ou fraturar o mundo pelo seu amor. 

Assim como em uma sinfonia, vários movimentos, ritmos, densidades e texturas distintas criam uma polifonia de significados e sensações, como descreve o encenador William Pereira. 

O espaço cênico comum coberto de areia se transforma em jardim, deserto, prisão e projeções estabelecem diálogo com a ação dramática. Areia, a terra infértil onde se sepultam os mortos, onde a semente não germina, metáfora de útero seco. (Divulgação)


"MEDEA" é o terceiro texto, que também se passa em uma prisão, sendo a personagem título uma presidiária, condenada por infanticídio: “Na noite do bote, encostei lábios de crianças em meu peito e alimentei. Enquanto sufocava-as com minhas garras doídas de fêmea feia, suja, nordestina, abandonada”. Nessa releitura de "Medea", de Eurípedes, a mulher abandonada e humilhada é transmutada em arquétipo da brasileira excluída. (Divulgação)






Comentário

Dos cinco textos sobre a maternidade como resistência, de autoria de Newton Moreno, encenados sob o título geral de "Um berço de pedra", nosso foco está na sua versão da "Medeia". 

Essa mãe assassina está encarcerada pelo crime. É uma mulher nordestina, privada da realeza em sua terra e jogada em uma favela onde de tudo fez para atender a seu homem, jamais nomeado, mas um traidor tal como o Jasão mitológico. 

Sua “puta carioca” tem o vestido de noiva incendiado por Medeia, que, depois disso, mata os filhos por sufocamento num ato de vingança pelo amor traído. Mas essa Medeia se diz morta junto com os filhos. Ela pragueja contra o amor e quer escavar um túnel de volta à sua terra. 

A pergunta que fica é: O que faz de Medeia Medeia? Digo, a princesa bárbara mitológica sai de cena sobranceira, sem arrependimentos, vencedora sobre o amor frustrado. Basta ser uma mulher traída vingativa para poder dizer no palco: eu sou Medeia!? Ainda assim, há que se dizer que o monólogo é belamente escrito e a interpretação de Luciana Lyra é pungente. (Renata Cazarini)